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Ser mãe é parecer o paraíso

qui, 15/04/2021 - 14:36 -- Gláucia Pinheiro
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O ser materno é aquele que cuida e que ao cuidar, adota

O pequeno poema que dá título à coluna de hoje nos instiga a pensar sobre o ser mãe. Sobre o tornar-se mãe e sobre esse ser que nasce quando acolhe em si um outro a quem chama de filho. Esse breve poema recolhido do livro “Poemas entre mãe e filho”, da autora Luisa Benevides, parafraseia, com licença poética o velho e batido dito popular que há tanto nos acompanha: “ser mãe é padecer no paraíso”. Do dito ao poema, uma hiância lógica, que marca os tempos e avanços da cultura, assim como os significantes que percorrem a maternidade. Do padecer ao parecer, uma passagem se dá do sacrifício ao ideal, fazendo uma passagem também do lugar e da posição da mãe no exercício da sua função nos nossos dias.

Mas afinal, o que é ser mãe? O que é ou quem é esse ser mãe?

Assim como uma mulher não nasce mulher, torna-se mulher, uma mulher também não nasce mãe. É nesse tornar-se que uma mulher pode, veja bem, PODE, também tornar-se mãe. Ser mulher, biologicamente mulher, não é condição para o ser mãe. Para ser mãe a biologia não é o destino. Sendo assim, mãe e mulher não são equivalentes, nem estão em pé de igualdade. Para ser mãe, ser mulher não é a condição. Uma mulher pode sim ter a capacidade biológica de gerar e parir um filho, mas a maternidade exige dela um mais além disso.A maternidade é da ordem de uma inscrição. Uma inscrição no desejo. Um evento a ser construído e sustentado no desejo. Trata-se de uma escolha marcada por uma decisão. Ser mãe é uma função, como bem nos ensina Freud. Uma função a ser ocupada, desejada, labutada, lapidada. Só exerce a função materna aquele sujeito convocado a isso pelo seu desejo. Como então definir em poucas palavras e linhas esse evento tão paradoxal?

O ser materno é aquele que cuida e que ao cuidar, adota. Longe do mito do amor materno, desse amor puro, incondicional e instintivo, romantizado e enaltecido, sacrossanto e sacrificial, uma mãe, para ser mãe, precisa adotar o filho. Toda maternidade é um ato de adoção. Todo filho precisa ser adotado. A maternidade não está dada e não é somente o radical da gestação. Assim, há mãe que é mãe, há pai que é mãe, há vó que é mãe. E há mãe que não é mãe. Há mulheres que não desejam ser mãe. E não há nenhum mal nisso.

Essa passagem do padecer ao parecer no exercício da maternidade rompeu também com esse fantasma de uma colagem de onde toda mulher é mãe. Abriu também, para a mulher a possibilidade do seu desejo de não ser. E não só. Há nessa passagem também a outra face da mesma moeda. A mulher/mãe, que diante do seu desejo de um filho, não precisa abdicar dos seus sonhos para além dele. Aqui, outro horizonte se abre. Mãe e mulher também não são funções ou posições excludentes. Uma mãe pode – e deve – lançar seu olhar para além do filho. Maternidade e feminilidade não se situam em posições opostas. Uma mulher que tem outros interesses para além da maternidade não deixa de ter interesse na maternidade. É nessa equação de divisão que a mãe/mulher vai aprendendo e ensinando, transmitindo e se construindo, no prover e no desprover do amor.
Ser mãe é faltar. Ser mãe é ser dividida. Ser mãe é saber que o filho existe sem ela. Ser mãe é ser coragem. É suportar para si que é não toda. Ser mãe é esse paradoxo. É permitir ao filho ir com ela, para além dela. E nesse exercício aprender que nem sempre ela será o melhor remédio para o filho e nem ele será o obturador do seu desejo. É nesse paradoxo de um esgotamento renovado, sem cartilhas, sem protocolos, sem ideais, que UMA maternidade pode ser vivida.

Até a próxima!

Gláucia Pinheiro

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Comentários

Enviado por Evelyne Rosa em
Que maravilha Glaucia! Amei seu texto, principalmente por você ressaltar a divisão que longe de ser um problema da maternidade é uma solução... Parabéns!!

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