Ser mãe muda tudo. Muda o corpo, a rotina, o olhar sobre o mundo e, claro, sobre si mesma. Independente de como a maternidade chega, (seja pelo parto, pela adoção ou pela entrega afetiva que constrói vínculos, como no caso das mãesdrastas) a experiência transforma a mulher em várias camadas. Com essa nova identidade, vem, inevitavelmente, um novo olhar para o espelho.
Na minha visão, tornar-se mãe é como se lançar de um penhasco, sem mapa, sem rede de proteção, sem manual de instruções ou roteiro, sem saber se vamos chegar do outro lado. E durante essa jornada, tentamos nos agarrar ao que conhecíamos de nós mesmas. Buscamos a mulher que éramos antes da maternidade como se ela fosse nosso marco de segurança. Mas não é. Porque nada na vida permanece como antes: a rotina muda, o sono muda, o corpo, o tempo para o autocuidado, as prioridades… tudo muda.
“Porque quando a mulher muda, o estilo pessoal muda junto. E isso não é abdicar de quem era, é vestir com verdade, quem está se tornando.”

Seria ingênuo imaginar que, depois de tamanha transformação interna e emocional, o vestir continuaria sendo o mesmo. Na maioria das vezes, o guarda-roupa se torna um local fragmentado. O que antes fazia sentido, agora não traduz mais. Roupas favoritas perdem significado. Estampas, modelagens, cores… tudo se tornou estranho, como se já não fossem suas… E esses sentimentos nada têm a ver com vaidade: é sobre identidade.
Enquanto escrevo essas linhas, uma cena de filme me vem à cabeça. A personagem está em uma sala quase vazia, sem distrações, apenas uma mesa e uma cadeira. Sobre a mesa, um caderno, uma caneta e um post-it com a seguinte frase: “Vamos começar de novo. Agora, reescreva quem você é. Use tudo o que tem, sua bagagem emocional, suas vivências, sua história. Tudo é matéria-prima para esse novo eu.”

A ruptura silenciosa

As roupas já não vestem como antes. Não é só uma questão de medidas. É que o significado mudou. A imagem antiga ainda vive na memória, muito fresca, e por vezes tentamos repetir fórmulas passadas para nos sentirmos “nós mesmas” outra vez. Mas é exatamente aí que mora a dor: a mulher de hoje não cabe mais na moldura de ontem.
Nos primeiros meses da maternidade, eu mesma tentei fazer isso. Queria reencontrar minha autoestima e, como tantas mulheres, procurei nos cabides antigos a mulher que eu havia sido. Mas o que encontrei foi frustração, desconexão, e um silêncio profundo entre o corpo e a imagem. Foi só quando entendi que não se tratava de recuperar a antiga Evelyn, mas de conhecer essa nova versão que estava surgindo, que as coisas começaram a fazer sentido.
A imagem pessoal que construímos vai muito além do que refletimos no espelho. A imagem pessoal carrega desejos, identidades, escolhas e silêncios. Por isso, quando uma mulher se torna mãe, é natural que o estilo também precise de tempo para se reorganizar. A pergunta “o que eu vou vestir?” ganha novos significados: não é apenas sobre se vestir bem, mas sobre sentir-se inteira dentro daquela nova versão.

O guarda-roupa como símbolo de reencontro
Nesse recomeço, o guarda-roupa deixa de ser só funcional. Ele ganha outro significado. Em dias em que há tanto por fazer, quando o cansaço, as demandas e a culpa materna ocupam mais espaço na cabeça e no coração do que gostaríamos, escolher o que vestir vira um ato de cuidado. E, muitas vezes, também de resistência.

Ter um tempo, mesmo que curto, para se arrumar, olhar no espelho com mais gentileza e lembrar que ainda existe uma mulher ali, faz toda diferença. Uma mulher que também importa. Que continua merecendo atenção, expressão, acolhimento. Para além da mãe, há um corpo, uma história e uma identidade em reconstrução.
O estilo passa a acompanhar essa nova fase, não como uma tentativa de voltar a ser o que era, mas como um reflexo do que está sendo vivido agora. Vestir-se, nesse contexto, vira reencontro. Um gesto de quem está aprendendo a se olhar de novo.
Estilo pessoal é identidade em construção

Falar de estilo pessoal nesse contexto é, antes de tudo, um convite à escuta. Não é sobre seguir uma cartela ou voltar a caber naquela calça de antes — é sobre se permitir sentir. Compreender seus novos limites, aceitar suas mudanças, redescobrir seus gostos. É sobre se perguntar o que ainda faz sentido, o que já não representa mais, o que ficou e o que floresceu. Porque estilo não é uma fórmula pronta. É uma expressão íntima. E mais do que isso: é autoconhecimento e autoestima.
Quando uma mulher se olha no espelho e enxerga além da roupa — quando vê quem ela está se tornando — algo poderoso acontece. Ela deixa de se vestir para caber e começa a se vestir para contar. Contar sua história. Contar quem ela é agora, com verdade, com ternura, com coragem. Estilo pessoal, nessa fase, é sobre inteireza. É sobre se olhar de frente e, em vez de julgar, abraçar. Abraçar essa mulher linda — por dentro e por fora — e vesti-la como quem cuida, como quem honra. Porque vestir-se, quando nasce uma mãe, também é uma forma de continuar sendo mulher.

No fim das contas, vestir-se, nesse novo ciclo, é sobre dar forma à mulher que nasceu junto com a maternidade, e que segue se revelando a cada dia. É sobre se enxergar com mais gentileza, se respeitar com mais clareza e se apresentar ao mundo com mais verdade. O estilo, aqui, não é vaidade: é linguagem. É uma forma de se reconectar com a própria história e de contar, em silêncio, quem se é agora.
Essa é só a primeira parte da nossa jornada por Recomeços Estilosos. Ao longo das próximas publicações da Mais que Moda, vamos continuar explorando outras fases da vida em que é preciso recomeçar: a mulher que empreende, que amadurece, que ousa, que muda de pele e que segue sendo muitas em uma só. Porque cada fase da vida pede um novo olhar. E o estilo é só o começo de tudo o que ainda podemos descobrir sobre nós mesmas.
Para acompanhar mais reflexões, bastidores e conteúdos sobre imagem e estilo, me encontre nas redes sociais: @evelynpinot.
Te espero na próxima edição da Mais que Moda.
Com carinho,
Evy