
Com a extrema polarização política evidenciada nos últimos tempos no Brasil e com o acesso fácil a plataformas digitais e redes sociais, a população conheceu seu poder de voz e descobriu que uma mensagem publicada rapidamente se espalha. Opiniões diversas, discursos cheios de ideologia (ou não) ganham espaço de forma rápida e abrangente.
Porém, em muitas publicações encontramos crimes disfarçados de opinião. E aí nasce o questionamento: e a minha liberdade de expressão?
Tema polêmico, não é mesmo?! Afinal de contas, a liberdade de expressão é mesmo ilimitada?
Muitos dizem que o mundo está chato, que tudo é “mimimi”, que sempre puderam falar tudo e nunca foram indagados.
Sociedades pluralistas são de fato construídas através de debates sadios e civilizados. Porém o que estamos presenciando (e isso se evidencia nas redes sociais) é uma euforia política, sem base, adentrando um campo de guerra, hostil e violento. Sobrou até para os cientistas que vem trabalhando no enfrentamento à pandemia de coronavírus.
A liberdade de expressão passa a ser escudo de discursos de ódio. E quem os profere, acredita estar amparado por uma liberdade absoluta, a de exprimir todo e qualquer tipo de colocação.
Diante deste cenário, considero importantíssimo, principalmente considerando que neste ano de 2022 passaremos por um pleito eleitoral, tecer aqui algumas considerações sobre o tema.
UM DIREITO CONSTITUCIONAL FUNDAMENTAL
O famoso artigo 5º da Constituição Federal (CF) está inserido no Título II - DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS.
As normas de direito fundamentais elencadas na Constituição Federal possuem forte conteúdo axiológico e são de grande importância dentro do ordenamento jurídico brasileiro, por essa razão possuem natureza de princípios.
É no artigo 5º que encontramos os incisos que dão base para o Princípio da Liberdade de Expressão. Senão vejamos:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
(...)
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;”
Mais adiante, o artigo 220 ainda dispõe que:
“Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.”
Todavia, é importante salientarmos que a liberdade de expressão não garante o direito absoluto de se dizer tudo aquilo que vem à cabeça, e isso porque, os limites são previstos diretamente pelo constituinte, eis que este direito pode colidir frontalmente com outro direito fundamental.
O direito à liberdade de expressão é um dos vários direitos fundamentais previstos pelo artigo 5º. Nele também se encontram os direitos fundamentais à vida, à propriedade, à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, dignidade da pessoa humana e diversos outros.
Imaginem se todo indivíduo tivesse a prerrogativa de exercício de um direito absoluto, como se daria a sua relação com outros indivíduos também detentores de um mesmo direito absoluto? Simplesmente não há possibilidade.
Ouço desde criança que “a minha liberdade termina onde começa a do outro”. E acredito que o filtro seja esse.
CONFLITO ENTRE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS FUNDAMENTAIS: COMO RESOLVER?
O fato é que muito tem se observado a ascensão de opiniões que comportam discursos de ódio de forma dissimulada em meio a pontos de vista políticos/religiosos, e que assustadoramente encontram outros indivíduos que dão suporte ou compartilham da mesma ótica.
Logo, confirma-se o fato de que é imperioso analisar os desdobramentos da liberdade de expressão de forma diligente e extensiva, haja vista que a Constituição Federal – mesmo parecendo categorizar tal liberdade como absoluta – atua em paralelo, impondo limites lógicos e explícitos, relativizando qualquer suposta superioridade.
A própria Constituição prevê, por exemplo, o direito de resposta proporcional ao agravo, sendo cabível indenização por danos materiais, morais e à imagem.
No Código Penal é feita a tipificação de crimes contra a honra, como calúnia, difamação e injúria, que são considerados restrições à liberdade de expressão.
A calúnia consiste em atribuir falsamente a alguém a autoria de um crime. Já a difamação consiste em imputar um fato ofensivo à reputação de uma pessoa. Por fim, a injúria é atribuir palavras ofensivas a alguém, criticando características físicas, expondo defeitos ou OPINIÃO QUE O DESQUALIFIQUE, não importa se falsa ou verdadeira (por exemplo: chamar alguém de macaco ou de veado, com conotação pejorativa).
No passado, muitos normalizavam a injúria. Porém quem recebia os xingamentos certamente não se sentia feliz.
Estamos em 2022 e já é tempo de respeitar o outro, de EVOLUIR e pensar antes de falar.
Por isso, quando há conflitos entre princípios constitucionais, é utilizada a RAZOABILIDADE. Existe um princípio chamado Princípio da Proporcionalidade e cada caso deverá ser ponderado.
Um exemplo são algumas medidas restritivas adotadas para controle da pandemia de coronavírus. Neste caso, há conflito entre o Direito à Vida x Direito de Ir e Vir.
Em relação à conflito envolvendo liberdade de expressão, podemos citar um exemplo clássico: Uma publicação em redes sociais convidando os pares para invadirem o Supremo Tribunal Federal e “quebrarem tudo”. Temos neste exemplo o crime de ameaça devidamente tipificado.
Fato é que este tema é muito abrangente e estamos tratando aqui de forma generalizada, mas temos visto na prática, diariamente, o judiciário tendo de utilizar a ponderação para julgar cada caso individualmente.
UM DIREITO GARANTIDO PELA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS (DUDH)
Pasmem, DIREITOS HUMANOS NÃO SERVEM APENAS PARA DEFENDER BANDIDOS!
A liberdade de expressão, tão utilizada de forma equivocada para defender discursos inflamados, é um direito assegurado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Liberdade de Expressão é o direito que permite as pessoas manifestarem suas opiniões sem medo de represálias. Igualmente, autoriza que as informações sejam recebidas por diversos meios, de forma independente e sem censura.
Todos podem manifestar suas opiniões, DESDE QUE essa opinião seja respaldada por veracidade e seja transmitida de forma RESPEITOSA.
O artigo 19º da DUDH diz que “todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão”.
A liberdade de expressão é necessária, fundamental. É um dos pilares da democracia.
Porém devemos aprender a diferenciar discurso de ódio de opinião, crime disfarçado de opinião.
O Ministério Público Federal realiza diversas campanhas nesse sentido:
Não podemos mais conviver com tanta fake news e publicações desrespeitosas, contraproducentes, que por vezes podem até tirar a vida de uma pessoa com menos acesso ao conhecimento, que acaba acreditando em tudo o que recebe por WhatsApp e lê na internet.
Quem publica e compartilha este tipo de “notícia” deve sim ser responsabilizado pelos seus atos.
Utilizem sempre a razoabilidade, pensem antes de falar e na dúvida, consultem um profissional.
Contatos:
Email: nathalia@nunesborges.adv.br
Algumas informações foram extraídas dos sites:
OEA|OAS (AQUI) e Jusbrasil (AQUI)
Fontes de pesquisa: Constituição Federal (AQUI)
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