Notícias e Variedades de Macaé
Início » Comment » Link permanente de comentário » Comentar

Comentar

A coragem da Esperança

qui, 24/12/2020 - 09:10 -- Gláucia Pinheiro
Categoria: 
Créditos: 
Imagem web
O que aprendemos com 2020?

O Natal chegou. Tempo que sempre suscita em nós reflexões. E com ele chega também o anúncio do fim de mais um ano. Não um ano como todos os outros, em que fizemos nossos propósitos e seguimos na trilha mais ou menos tortuosa da busca e realizações dos nossos objetivos e planos. 2020, o ano que não aconteceu?! Ou o ano que foi um grande acontecimento?! O ano que abriu a segunda década de um novo século e que anunciou um novo tempo, de mudanças radicais e estruturais na nossa forma de estar no mundo. Um ano, de fato, novo. Novo naquilo que a novidade comporta de originalidade, ineditismo e surpresa. Novo naquilo que ele traz de inesperado.
A aridez que se fez presente na dureza dos dias, exigiu que tornássemos nulos os simples hábitos. Novas práticas, novos modos de funcionamento, novas formas de se relacionar se impuseram. O cuidado passou a ser palavra de ordem. Cuidar de si é cuidar do outro. A reinvenção tornou-se marca registrada daqueles que precisaram encontrar uma nova forma de sobre/viver.
O inimigo invisível e microscópico que se instalou entre nós nos colocou frente a frente com o real do desamparo que nos origina. Olhamos nos olhos da vulnerabilidade da nossa existência. Tivemos exposta nossa fragilidade e nossos medos. Escancarou-se diante de nós, em covas rasas, nossa finitude. Nem mesmo o luto de nossos mortos pode seguir o ritual que nos traz o pouco de conforto necessário ante o indecifrável da vida. Ninguém, nem mesmo o mais desavisado dos homens, passou incólume por esses tempos sombrios. Aquele que não sentiu o peso da incerteza, o medo do desconhecido, a angústia da solidão, o desconforto da presença intensa do outro, a impossibilidade do encontro, a urgência da saudade, o aprisionamento da liberdade, a alucinação de um abraço, não viveu 2020.
Mas 2020 não foi apenas um ano de perdas, faltas, ausências, retrocessos e ameaças. O luto foi verbo e a luta se fez presente dentro e fora de nós mesmos. Em nosso recolhimento travamos lutas internas. Olhamos para dentro de nós, das nossas casas, de nossa intimidade, de nossos afetos. A necessidade nos fez conhecer e desbravar cantinhos escondidos de nosso “não-ser”. Descobrimos o que não sabíamos que sabíamos de nós. Desbravamos nossas habilidades adormecidas. Experimentamos gostos esquecidos. Aventuramos na gangorra emocional em que nos penduramos.
Lutamos também do lado de fora. Ao ver desnuda a desigualdade social, sem nenhum véu para recobri-la. Lutamos pelo respeito à vida, pela igualdade de direitos, assistência e cuidado. Pelo amparo ao próximo. A desigualdade social e a incompetência ignorante de nossos governantes nos colocaram no topo de um vergonhoso ranking.
Esse tempo tortuoso também proporcionou ensinamentos. Aprendemos, construímos saberes e autoconhecimento. Entendemos quão cara é a educação e a presença afetuosa daqueles que arduamente se empenham nessa arte. Compreendemos que a saúde pública é prioritária, que a saúde mental é preciosa, que a democracia é um bem maior e que nossos heróis são de carne e osso, sangram, sofrem e choram. E fomos inebriados pelo bálsamo da arte, que nos trouxe fôlego, frescor, acalanto para enfrentar os dias intermináveis de confinamento. A música invadiu nossas casas e entendemos que ofertá-la é mais que um ato de carinho, é um ato revolucionário. A arte foi nossa resistência nesse compasso de espera. Abraçamos com palavras, sorrimos com os olhos, festejamos virtualmente, choramos no silêncio da nossa solitude. Descobrimos que o muito às vezes é tão pouco e simples e que o pouco e simples basta. Nos demos conta de que a amizade e a família são nossos bens mais valiosos e serão sempre nosso porto seguro. E confirmamos a máxima de que o melhor lugar do mundo é mesmo dentro de um abraço.
Os laços de ternura e afeto que fomos tecendo nos nossos microuniversos confinados foram aos poucos se espalhando, viralizando em rede, e numa grande teia fizeram com que o cuidado, a empatia e a solidariedade fossem aos poucos vencendo a indiferença. Eis que sobrevivemos a esse intervalo e chegamos a dezembro, prestes a invadir 2021. E sobreviver neste momento não é pouco coisa.
Com planos marcados pela incerteza, projetos em suspenso, o medo de volta avassalador, ainda na clausura de nossos lares, buscamos algo no qual possamos nos segurar para seguir adiante. E a palavra que nos serve de esteio, carregada de afeto, é ESPERANÇA.
Essa dona de olhos verdes, que em alguns momentos se precipita no abismo da desilusão, renasce, intacta, renovada, com o frescor da criança diante das suas descobertas do mundo, com olhos brilhantes e dedinhos nervosos. A ESPERANÇA a cada novo amanhecer de um novo ano, nos lembra que os sonhos não envelhecem e aponta para o futuro que está logo ali na frente a nos esperar.
Ao fatiar o tempo nesses pedaços que chamamos anos, como poetiza Drummond, dona ESPERANÇA trabalhar arduamente, até a exaustão. Para então, depois de entregar os pontos, precipitar-se lá “do alto do décimo segundo andar do ano”, e estatelar-se lá embaixo, ilesa, com seus olhinhos verdes brilhantes, nos convidando a renovar nossos desejos e propósitos. A ESPERANÇA, essa velha senhora com ares de menina, ou essa menina com a sabedoria de uma senhora, lança o olhar para o futuro, segura nossa mão e exige de nós coragem para acreditar e lutar por dias melhores.
Assim, na certeza de que viver exige coragem, como afirma Guimarães Rosa, e que quem sabe esperar não necessita fazer concessões, como nos ensina Freud, vemos 2021 apontar a nossa frente. E o desejo que se relança é de que 2021 seja um ano velho, como aqueles de outrora. De muitos abraços, de encontros festivos, de amores inesperados, de beijos roubados. De cuidado, toques e afagos. Da ocupação das ruas, dos parques, das praias. Que em fevereiro tenha carnaval! De crianças correndo e de velhinhos jogando dama na pracinha.
Que essa senhora que hoje nos sorri com seus brilhantes olhos verdes, nos acompanhe na aposta corajosa de construir esse velho 2021.

Até a próxima!

Contatos:

IG: glauciappsicanalise

Cel/ Whats: 22 98151 0432

E-mail: galpinheiros03@gmail.com

Seu comentário será liberado pelo administrador. Informe-se sobre as regras de moderação de comentários no Termo de uso.
CAPTCHA
Resolva a soma abaixo por questões de segurança
6 + 1 =
Solve this simple math problem and enter the result. E.g. for 1+3, enter 4.

Marca da Agência Logomotiva - Presença Digital - Agência desenvolvedora e mantenedora